terça-feira, 8 de junho de 2010

Aniversário de Jorge Passos - Meu Pai


Como é comemorar os noventa anos de um Pai?
Pois é, hoje dia oito de Junho, o meu Pai está comemorando 90 anos de idade.
O Sr. Jorge Rangel dos Passos, ou melhor, Jorge Passos, ou Passos, Seu Jorge, são os vários modos para chamá-lo que os amigos, conhecidos, desconhecidos usam, sempre de uma forma amigável, carinhosa.
Mas quem é o Jorge Passos? Vamos conhecer um pouco de sua história de vida. É um pouco mesmo, pois a sua vida é longa, com muitos revezes, mas também com muitas vitórias e uma delas é este momento, festejar o seu aniversário de 90 anos cercado de seus filhos, netos e bisnetos, com saúde, lúcido e com uma grande vontade de viver.
O Seu Jorge nasceu num dia 8 de Junho de 1920 (caramba, início do século XX!).
Viveu, a partir dos cinco de idade, ao lado de seu Pai, Seu Alberto, que o criou sozinho, após o falecimento de sua Mãe, Dona Maria Passos.
Estudou, completou o curso técnico na Escola Técnica Visconde de Mauá, no bairro de Marechal Hermes. Prestou o serviço militar. Após a baixa, foi admitido como funcionário do Município do Rio de Janeiro. Convocado para a 2ª Guerra Mundial, seguiu de navio para a Itália, onde participou de várias vitórias da FEB, sendo a Tomada do Monte Castelo, uma delas. Voltou ferido, sendo condecorado pelo Exército Brasileiro com uma Medalha.
Antes de seguir para guerra, ele namorava a Srtª Cely do Carmo, filha de Dona Maria do Carmo de Oliveira. Após a recuperação dos ferimentos de guerra, deu baixa, reassumindo o seu posto de funcionário municipal. Casou com a Srtª Cely, com a qual teve sete filhos, três meninos e quatro meninas, alguns anos mais tarde, ele e D. Cely trouxeram uma menina de Sepetiba para ser cria-da por eles, e que hoje vive em sua casa, aonde chegou com dois anos de idade.
A sua vida profissional, (da qual não sei muito, mas tenho algumas lembranças) não foi fácil, pois com sete filhos, todos com saúde, teriam de haver muitos gastos com alimentação, roupas, etc.
Eu me lembro que à época do Natal, todos os filhos ganhavam roupas e sapatos novos.
Morávamos na Rua Bangu número 203, numa casa dividida com o Tio Bertolino e Dona Isabel, e seus filhos, Didi (Dr. Cladyr de Mattos), Clair, Maninha (Maria da Penha) e Roberto. Nós morávamos na parte da frente. Depois mudamos para a casa de número 229, na mesma rua, onde, (eu acho), nasceu a Maria Aparecida, a caçulinha. Era uma casa maior, com vários cômodos. O Vô Alberto, nesse tempo morava com a gente. Foi ele que me ensinou as horas. Ele tinha uma pequena oficina onde fazia alguns consertos e era o lugar onde ficava a maior parte de seu tempo até se mudar para Sepetiba por questões de saúde. O quarto do meu Avô ficava bem no meio da casa, onde foi colocada uma parede de madeira a qual formava um corredor que ia da sala de refeições até a sala de visitas, um local que nós frequentávamos muito pouco. Naquele tempo não tinha televisão, mas rádio sim, que ficava na sala, em cima de uma pequena prateleira. Nós, as crianças ficávamos o tempo todo brincando no quintal, que era enorme, onde até hoje existe uma mangueira que de vez em quando ainda sonho com ela, tal a quantidade de lembranças que guardo dela. Era o meu refúgio, foi a primeira árvore em que consegui subir, pois eu era gordinho e tinha medo de subir em árvores cair e me esborrachar. Tem até um episódio que não consegui esquecer: o Jairo, meu irmão logo abaixo de mim, me deu uma volta danada. Havia uma goiabeira, onde eu não subia nem por decreto. Um dia, eu avistei uma goiaba que parecia estar madura bem lá em cima e pedi ao Jairo para subir na árvore e verificar se ela estava madura. Ele disse que não estava ma-dura. Pois bem, a goiaba estava madurinha, porque ele voltou lá, colheu a fruta e comeu todinha, nem me deu uma mordida. Fiquei danado de raiva e contei para a minha mãe que deu a maior surra nele. Acho que depois desse episódio, perdi o medo de subir em árvores. Só levava prejuízo!
O seu Jorge para sustentar aquele pequeno exército tinha que se virar em empregos. Ele era funcionário municipal, motorista de táxi, guarda-noturno. Um dia, quando trabalhava na Guarda, o paiol de Deodoro explodiu. Ele chegou à casa apavorado. Foi uma loucura. Todo mundo saiu de suas casas. Na Rua da Feira, que beirava com o muro da Fábrica Bangu, as pessoas, homens, mulheres e crianças vestidas de camisola, pijama, do jeito como se levantaram da cama, saíram a caminhar uma atrás das outras, indo para não sei onde. Eles estavam fugindo da morte. Nós mesmos, juntamente com alguns vizinhos fomos no, caminhão de seu Jacó, (inclusive a família dele), parar lá em Sepetiba na casa onde o Vô Alberto morava.
Houve uma época, para ganhar mais algum dinheiro passou a vender macarrão junto com Seu Paixão, um amigo seu. Não tenho muita lembrança desse tempo, mas era isso mesmo. Tinha que arrumar "algum", as crianças cresciam e precisavam comer para crescer.
Tempo para dormir, era muito pouco. Mas a gente não ficava sem comida.
Hoje nós reclamamos que a situação está difícil e só temos um ou dois filhos, a exceção fica por conta do meu irmão Jorge, que tem cinco, dois garotos e três meninas e agora uma neta. Hoje tem pizza, cachorro quente, hambúrguer, vários "quebra-galhos". Naquele tempo tinha que ter feijão com arroz, angu, linguiça, mortadela frita, ovos, carne, que lá em casa era chamada de carretel, pois tinha que render até a comida do prato acabar. Podia repetir tudo, menos a carne. Um quilo de carne dava para sete crianças e três adultos no almoço e na jantar. Como? Eu não sei, mas que dava, dava. A minha avó, Dona Maria Crioula, passou a viver conosco. Era uma comida forte que não deixava nenhum de nós ficar doente. Só, as vezes, uma gripe - o nariz ficava tão entupido que a gente dormia sentado com o peito e o nariz cheio de vick vaporub e garganta inflamada. Os remédios eram chá de folhas de laranja da terra com um comprimido de Melhoral socado que deixava o chá azedo. (Lembro-me do gosto até hoje. Horrível. Arghh!)
Mas era uma vida feliz, tranquila, sem muitas novidades.
Seu Jorge iniciou, então, a sua fase de artista.
Numa época de festa junina, com seus filhos e os dos vizinhos crescendo, ele resolveu montar uma quadrilha com estas crianças. Tinha até casamento e o texto era todo em versos, tudo rimado e bolado por ele. Eu era o padre, por ser o mais gordinho.
E não é que a idéia deu certo! Dançamos quadrilha por não sei quantos anos.
Depois, no Carnaval, as meninas começaram a se fantasiar, minha irmãs, as filhas do Valter Pardal e Geninha, da Dirce e Adaílson, da Elza e Machadinho, do Mozart e da Nair, do Heitor e da Dina e algumas meninas vizinhas. Eram quase vinte meninas, talvez mais, que formaram um grupo e que se fantasiaram por vários carnavais. As músicas eram paródias que o Tio Jordelém criava, usando as melodias de músicas conhecidas.
Quando Seu Jorge se elegeu Diretor do Casino Bangu (é com um "s" só mesmo), a coisa melhorou ainda mais. Ele começou a fazer uma série de eventos infantis no clube: teatrinhos, esquetes musicais, e nós éramos os artistas. Teve algumas crianças que se aventuraram até à televisão levadas por suas mães.
Nesse tempo, para não perder o costume, Seu Jorge arranjou um emprego de Inspetor no Colégio São Jorge, de propriedade do Professor Eloy Barreto, seu amigo, onde as minhas irmãs e meu irmão Jorge estudaram e fizeram o 2º grau. Eu fiz o Curso Técnico de Contabilidade naquele colégio.
A gente foi crescendo, arrumando emprego e o Seu Jorge se aposentou.
Ele ficou ainda algum como Diretor do Casino Bangu, sempre sob a presidência de Seu Osvaldo Gomes, dono do cinema Vitória.
Depois que ele se desligou da diretoria do Casino, continuou a frequentar o clube com a família nos carnavais, nos bailes. Era a época dos grandes bailes quando grandes orquestras vinham se apresentar no Casino.
Acho que nesse período ele se juntou a um grupo de soldados que participaram da 2ª Guerra Mundial e formaram o Grupo de Ex-Combatentes de Bangu sob a direção dele, Jorge Passos e outros companheiros construíram e inauguraram até um Monumento aos Pracinhas, na Praça da Fé, em Bangu e que se comemora a sua fundação todos os anos no mês de maio.
Os ex-Combatentes se reuniam todos os meses na sede do Grupo, que funcionava na casa de Seu Jorge. Isto sustentou as vidas deles por vários anos. Hoje em dia não há mais reuniões festivas, pois o Grupo se desfez pelas contingências da vida, mas Seu Jorge continua como o responsável ajudado pelo Seu Cândido, comparecem a algumas festividades onde se comemora, ainda, os feitos da campanha na 2ª Guerra Mundial.
Essa é a vida de Jorge Passos, Seu Jorge, Passos. São alguns trechos, é verdade, mas uma pequena mostra de uma vida de muito trabalho, perseverança, altruísmo desse Grande Homem, que é o Pai do Clei, do Jairo, da Icléia, do Jorginho, da Cleide, da Gecilda (Tida), da Maria Aparecida e da Ana Cristina que lhe deram muitos filhos, netos e bisnetos.
Nossos Parabéns, nesse seu dia, Seu Jorge!
Nós temos um grande orgulho de sermos seus filhos!